Blog conecta.ag | Soja, milho e trigo, em dólares, estão até 35% acima da média histórica

Soja, milho e trigo, em dólares, estão até 35% acima da média histórica, apesar da pressão dos últimos meses sobre as commodities

Margens de rentabilidade para produtores brasileiros estão menores do que as dos últimos dois anos, mas não são baixas e trazem resultados importantes. Novas safras do Brasil serão determinantes para recompor oferta em meio a uma crise de alimentos


A finalização da primeira quinzena de outubro foi marcada por uma baixa generalizada das commodities nos mercados internacionais. Entre as agrícolas, o trigo liderou as perdas, com baixas de quase 30 pontos nos principais vencimentos e com as cotações voltando a operar abaixo dos US$ 9,00 por bushel na Bolsa de Chicago (CBOT). Ainda no terminal, perdas de mais de 10 pontos na soja e de 7 pontos no milho, com recuos observados também entre os derivados da oleaginosa e o óleo acompanhando o petróleo. 

 

Os futuros do petróleo WTI negociados nas bolsas externas caíram forte nos últimos dias, levando o barril a pouco mais de US$ 85,00, enquanto o brent, em Londres, também caiu, ficando na casa de US$ 91,00 por barril. Na Bolsa de Nova York, perdas também foram registradas para os futuros do café arábica e do algodão, não deixando nem mesmo o ouro de fora, tamanha a aversão ao risco registrada nos mercados nos últimos dias.

 

 

Ainda assim, como explica o sócio-diretor da Cogo Inteligência em Agronegócio, o "grupo" soja, milho e trigo ainda apresentam preços, em dólares, que estão entre 30% a 35% acima da média histórica. "Ou seja, as agrícolas estão sentindo, saíram das máximas, houve exagero nas baixas, e agora tentam se encontrar em um ponto de equilíbrio. Abaixo destes níveis, também se compromete a formação de novas safras. Então, há muita pressão de baixa, e parece muito claro que não há espaço para que isso ocorra", diz. 

 

Os futuros dos grãos, portanto, buscam garantir estes pisos porque, como explica Cogo, "entre os fundamentos há problemas que estão longe de serem resolvidos". Para o produtor brasileiro, as margens de rentabilidade serão menores em relação às últimas duas safras, porém, ainda positivas, tanto na soja, quanto no milho, de acordo com o analista de mercado em entrevista ao Notícias Agrícolas. "Não são margens baixas, mas muito baixo do que os dois pontos bem altos que o produtor viu nas últimas duas temporadas", detalha. 

 

Mercado financeiro avesso ao risco

Segundo analistas e consultores internacionais, as baixas conjuntas - que levam as commodities a mais uma semana de saldo negativo - refletem a combinação de temores com a recessão, os índices inflacionários muito elevados no mundo do todo - com destaque para a inflação mais alta em 40 anos nos Estados Unidos, com os números vindo bem acima do esperado pelo mercado - e todos os impactos que isso possa ter sobre a demanda e que pesam direta e severamente sobre os mercados. 

 

Na segunda semana de outubro, a Organização dos Países Produtores e Exportadores de Petróleo e Aliados (Opep+) trouxe um corte em suas estimativas de demanda por petróleo não só para 2022, mas também para 2023, dando início a um movimento mais intenso de queda dos preços. A pressão veio mesmo diante de, no começo da semana, a organização já ter acordado entre seus membros sobre um corte na produção de até dois milhões de barris por dia. 

 

"Todas as principais histórias de demanda por petróleo estão se tornando muito baixistas para o petróleo. Até agora, a temporada de lucros e as expectativas de inflação apoiam a ideia de que o Fed terá que continuar apertando até que envie a economia para uma recessão", disse Ed Moya, analista sênior de mercado da Oanda à agência internacional de notícias Bloomberg.

 

Região Noroeste de Minas Gerais é a principal área produtora de algodão do estado - Foto: CNA

 

Do lado da demanda, quem mais preocupa é a China. A nação asiática é a maior importadora global do óleo e tem seu consumo muito afetado pela política de tolerância zero contra o Covid-19. Depois do feriado da Semana Dourada, de 10 dias, o número de novos casos subiu muito, promovendo um incremento grande também no número de províncias que voltaram a entrar em lockdown. Neste final de semana, o Congresso do Partido Comunista se inicia e tudo tem que estar sob controle, ao menos até onde seja possível. 

 

Na outra ponta, a Agência Internacional de Energia (IEA, na sigla em inglês) alertou sobre os cortes de produção sinalizados pela Opep podendo, inclusive, acelerar o processo de recessão global, já que a oferta já não está em seu momento mais confortável e também destacando a esgotada capacidade mundial de refino do petróleo bruto, o que deixa, por exemplo, o mercado de diesel ainda mais estrangulado. 

 

"As preocupações com a recessão e o impacto relacionado à demanda permanecerão em foco agora que há um pouco mais de clareza sobre a oferta após a reunião da Opep+", afirmou, também à Bloomberg, o chefe de pesquisa de energia da Alerian Vettafi, Stacey Morris. Ainda no radar - e no centro dele - do mercado de energias, continuam as tensões e desdobramentos com a guerra entre Rússia e Ucrânia, com os impactos sobre o mercado de gás natural. 

 

Agrinvest acredita que sojicultor brasileiro terá retorno financeiro 50% menor na safra 22/23

A safra mais cara da história. Desde o início dos trabalhos de preparo para o ciclo 2022/23 de soja do Brasil essa frase já vinha sendo dita e o alerta sendo feito pelos analistas e consultores de mercado aos produtores brasileiros. E assim, o cenário vai se desenhando. 

 

Tanto o mercado cambial no país, quanto o da soja na Bolsa de Chicago têm estado muito voláteis e a chance do sojicultor vender seu produto em um dólar mais baixo do que o utilizado para a compra de insumos - que apresentaram altas muito expressivas, puxadas, principalmente pelos fertilizantes -, ou seja, o quadro sinaliza, portanto, margens de renda muito menores.

 

"A situação que se desenrola para safra 2022/23 traz muita preocupação para o produtor rural brasileiro diante da disparada dos custos e o forte recuo da margem financeira", afirma o analista de mercado Marcos Araujo, da Agrinvest Commodities

 

Assim, o especialista fez os cálculos e mostra que o retorno financeiro da soja que está sendo plantada agora pelos brasileiros deverá resultar em um retorno financeiro 50% menor em relação à safra anterior - considerando uma base em Sorriso, no Mato Grosso. "Os produtores devem estar muito atentos aos riscos do mercado e ao gerenciamento do risco de preço diante de tantas variáveis que temos neste momento", alerta o analista.

 

Com um custo total estimado - no município em questão - de R$ 7409,73, o lucro seria de R$ 1494,62 por hectare. Na temporada 2021/22, o custo total foi, em média, de R$ 4678,39, e lucro de R$ 4420,28. O cálculo detalhado de Aráujo considera:

"De acordo com nossas estimativas temos: 

Custo Operacional Efetivo (COE) R$6.064,39 por hectare

Custo Operacional Total (COT) R$6.393,26 por hectare

Remuneração dos Fatores (RFT) R$1.016,47 por hectare

Custo Total (CT) R$7.409,73 por hectare

Produtividade esperada 65 sacas por hectare

Preço de venda R$136,99 por saca

Receita Bruta (RB) R$8.904,35 por hectare

Margem Bruta (MB) R$2.839,96 por hectare

Margem Líquida (ML) R$2.511,09 por hectare

Lucro (L) R$1.494,62 por hectare". 

 

Para a segunda safra de milho de 2023, as preocupações são as mesmas e a baixa na margem de lucro é semelhante. Os cálculos de Marcos Araújo apontam para um custo total de R$ 5431,39 por hectare - contra R$ 4408,91 da safrinha 2022 - e um lucro esperado de R$ 1741,01 por hectare, enquanto a média da anterior foi de R$ 2454,31. 

 

"Considerando:

Custo Operacional Efetivo (COE) R$4.244,69 por hectare

Custo Operacional Total (COT) R$4.555,04 por hectare

Remuneração dos Fatores (RFT) R$876,35 por hectare

Custo Total (CT) R$5.431,39 por hectare

Produtividade esperada 120 sacas por hectare

Preço de venda R$59,77 por saca

Receita Bruta (RB) R$7.172,40 por hectare

Margem Bruta (MB) R$2.927,71 por hectare

Margem Líquida (ML) R$2.617,36 por hectare

Lucro (L) R$1.741,01 por hectare". 

 

Valores da soja no Brasil até reagiram nos últimos dias, diz Cepea

No início da segunda quinzena de outubro, os preços da soja voltaram a subir no mercado interno na semana passada. Pesquisadores do Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada (Cepea, da Esalq/USP) destacam que o impulso veio das subsequentes chuvas nas principais áreas em que são plantadas a oleaginosa no Brasil, que têm atrapalhado os trabalhos de campo – no Paraná, alguns agentes já indicam necessidade de replantio em parte das áreas do oeste e sudoeste do estado. 

 

“Além disso, as valorizações nos contratos futuros externos também reforçaram o movimento de alta nos preços no Brasil. Neste caso, o avanço internacional esteve atrelado a estimativas indicando menor oferta de soja nos Estados Unidos”, disse o centro em nota.