Estratégias de manejo contra a ferrugem-asiática na soja podem ser mais eficazes com estudo do genoma do patógeno

Segundo a Embrapa, o genoma do fungo causador da doença, o Phakopsora pachyrhizi, é um dos maiores entre os patógenos vegetais.

 

Por Notícias Agrícolas


Com tamanho similar ao próprio genoma da soja, o genoma do fungo Phakopsora pachyrhizi, causador da ferrugem-asiática na planta, vem sendo estudado por pesquisadores da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa). Segundo reporte da instituição, este fungo possui um dos maiores genomas entre os patógenos vegetais.

 

Os pesquisadores ainda relatam que o genoma possui sequências que se repetem (elementos transponíveis ou transposons), e que podem alterar a posição em que se localizam no genoma. Essa característica em especial possibilita formas de se adaptar e até escapar, de certa forma, de ações de manejo contra a doença.

 

“Essas foram algumas das descobertas obtidas a partir do sequenciamento e da montagem de três genomas do microrganismo (Phakopsora pachyrhizi), realizados entre 2019 e 2021 pelo ASR Genome Consortium, grupo internacional de pesquisa”, pontuou a instituição.

 

Francismar Marcelino-Guimarães, pesquisadora da Embrapa Soja, no Paraná, apresentou a descoberta no IX Congresso Brasileiro de Soja, em Foz do Iguaçu (PR), realizado em maio. “Vimos, por exemplo, que parte desses elementos estão ativos no genoma do fungo durante sua interação com a soja, o que pode contribuir para sua variabilidade genética e, consequentemente, para sua adaptabilidade às medidas de controle”, destacou Francismar.

 

Ela ainda ressalta que “a disponibilidade do genoma de referência do fungo é essencial para o avanço no conhecimento da biologia e nos fatores envolvidos na adaptabilidade desse fungo, com o intuito de acelerar o desenvolvimento de novas estratégias de controle da ferrugem-asiática”.

 

Outro aspecto trazido ao público pela cientista é o fato de que o fungo P. pachyrhizi possui um esporo contendo dois núcleos que são diferentes entre si, fator conhecido também como polimorfismo. Francismar pontua também a baixa comunicação entre estes núcleos.  “Essa característica possibilita que esse fungo mantenha variações ou cópias alternativas de genes, o que também pode constituir uma fonte de variação importante”, diz a especialista.

O fungo tem uma característica especial que possibilita formas de se adaptar e até escapar, de certa forma, de ações de manejo contra a doença - Foto: Notícias Agrícolas

 

Para além da análise do genoma do fungo da ferrugem em si, a pesquisadora explica no reporte da Embrapa que a referência dente genoma tem permitido que se observe correspondências entre o P. pachyrhizi e outras espécies de fungos.

 

De forma complementar, a pesquisa também apontou “famílias de genes exclusivas em P. pachyrhizi , algumas com elevado número e outras com número reduzido, quando comparadas com outras espécies”. A cientista Francismar explica que  são genes ligados à produção de energia e no deslocamento de nutrientes da planta. Este fator pode ser um indicativo de uma maleabilidade em seu metabolismo e adequações ao seu parasitismo

 

“Entender o estilo de vida desse parasita, em nível molecular, é importante, por exemplo, para identificarmos os genes que podem atuar no parasitismo da planta de soja e, portanto, que são essenciais à aquisição de nutrientes e à sobrevivência do fungo”, explica a cientista. “Tais genes são alvos importantes para o desenvolvimento de estratégias de controle, como as de silenciamento gênico ou RNA interferência, que podem comprometer processos vitais da espécie e reduzir a agressividade do fungo”, destacou a pesquisadora.

 

Estratégias de manejo para a ferrugem-asiática da soja

A partir do momento em que passou a ser registrada no Brasil, no ano de 2001, segundo a Embrapa, a ferrugem-asiática da soja, causada pelo fungo Phakopsora pachyrhizi, passou a ser considerada uma das doenças mais severas para o cultivo, causando perdas de até 80% da produção caso não for controlada da maneira correta.

 

De acordo com informações compiladas pelo Consórcio Antiferrugem, caso a doença atinja plantações da cultura, os custos podem chegar a  US$ 2 bilhões por safra no Brasil, levando em conta a compra de fungicidas e as perdas de produtividade em função dos estragos causados pela.

 

As estratégias de manejo estão centradas em práticas como:

 

  1. O vazio sanitário, que é o período de pelo menos 90 dias sem plantas vivas de soja no campo, para redução do inóculo do fungo;
  2. A utilização de cultivares de ciclo precoce e semeadura no início da época recomendada como estratégia de escape da doença;
  3. A adoção de cultivares resistentes, respeito ao calendário de semeadura;
  4. A utilização de fungicidas”, ressalta a Embrapa no reporte.

 

A instituição ressalta que  o fungo causador da ferrugem-asiática da soja, P. pachyrhizi, contém mutações que fazem com que ele tenha resistência aos três principais grupos de fungicidas “sítio-específicos”.

 

“O fungo causador da doença é capaz de se adaptar a algumas das estratégias de controle, seja pela perda da sensibilidade aos fungicidas ou pela “quebra” da resistência genética das cultivares de soja”, explica a pesquisadora da Embrapa Soja, Cláudia Godoy.

 

Sendo assim, a indicação da instituição é para que os agricultores produtores de soja sigam as medidas corretas de manejo da cultura com o objetivo de  preservar os fungicidas e as cultivares disponíveis. 

 

“Todas as estratégias quando utilizadas de forma conjunta têm permitido um manejo adequado da doença. Algumas regiões que utilizam cultivares precoces para fazer uma segunda safra com milho ou algodão têm apresentado escape ou incidência tardia da ferrugem-asiática e outras doenças têm predominado na cultura. Em regiões que semeiam mais tarde, as cultivares com gene de resistência e os fungicidas têm proporcionado um bom controle, mesmo com todo o problema de resistência que vem ocorrendo”, explica Godoy.

 

O Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa) publicou em agosto de 2021 a Portaria nº 388 que estabelece o vazio sanitário como uma maneira de mitigar o aparecimento do fungo causador da ferrugem-asiática da soja. Além disso, o documento estipula o calendário de semeadura como um critério fitossanitário para racionalizar a quantidade de aplicações de fungicidas.

 

A importância do vazio sanitário da soja

De acordo com informações levantadas pela Embrapa e divulgada no reporte, nos meses de junho e julho começa o vazio sanitário nos três maiores produtores de soja do país: Paraná (10 de junho), Mato Grosso (15 de junho) e Rio Grande do Sul (13 de julho). 

 

Este período de vazio sanitário é a época determinada e contínua em que fica proibido manter plantas vivas de soja em uma determinada área. Esse tempo deve ser de, pelo menos, 90 dias sem a cultura e sem plantas voluntárias no campo, pontua a instituição. “O objetivo é reduzir a população do fungo no ambiente na entressafra e assim atrasar a ocorrência da doença na safra”, explica a pesquisadora da Embrapa Soja, Claudine Seixas.

 

Os períodos de vazio sanitário são estabelecidos todos os anos pela Secretaria de Defesa Agropecuária a partir de sugestões dos órgãos estaduais de Defesa Sanitária Vegetal. 

 

Semeadura da soja marcada no calendário

Estabelecer um calendário adequado para a semeadura da cultura da soja, segundo a Embrapa, se configura como uma importante estratégia para que se possa reduzir o número de entradas em campo para aplicação de fungicidas no decorrer da safra e, consequentemente, diminuir a chance de seleção de resistência do fungo aos fungicidas.

 

A pesquisadora Claudine Seixas ressalta que a soja que for plantada de maneira tardia pode ser infectada pelo fungo ainda no começo da safra, quando a planta se encontra em estádios vegetativos. Isso implica no adiantamento da aplicação de fungicida e proporciona maior número de aplicações. 

 

“Quanto maior o número de aplicações, maior a exposição dos fungicidas e maior a chance de acelerar o processo de seleção de populações resistentes a esses produtos”, explica. 

 

Dia 10 de junho começa o vazio sanitário da soja no Paraná

Na sexta-feira, dia 10 de junho, tem início o vazio sanitário para a cultura da soja no estado do Paraná, segundo divulgado pela agência estadual de notícias. “Nesse período de 90 dias fica proibido cultivar, manter ou permitir a existência de plantas vivas de soja no campo. O objetivo é limitar a sobrevivência do fungo causador da ferrugem asiática durante a entressafra e, consequentemente, reduzir a incidência e atrasar a ocorrência da doença na próxima safra” apontou a agência.

 

Segundo Renato Rezende Young Blood, gerente de Sanidade Vegetal da Agência de Defesa Agropecuária do Paraná (Adapar), é de suma importância que todos os produtores tenham esse cuidado em suas propriedades. 

 

“A prática do vazio sanitário da soja beneficia o agricultor, que terá essa doença cada vez mais tarde e, dessa forma, necessitará menos aplicações de fungicidas, além de auxiliar na manutenção da eficácia desses produtos para o controle da ferrugem”, disse Blood.

 

O gerente de Sanidade Vegetal reforça que a esta medida como forma de proteção sanitária apenas será eficaz com o monitoramento de todos os locais que possam conter plantas vivas de soja e que, se for detectada de alguma maneira, seja imediatamente eliminada. 

 

“Assim, além das lavouras em pousio, os cultivos de inverno, como trigo, aveia e cevada, também devem estar sob vigilância, para o efetivo controle de qualquer planta de soja que possa aparecer”, afirmou. “As áreas em beiras de rodovias e estradas de acesso às propriedades devem ser inspecionadas e, se constatadas plantas voluntárias de soja, deve-se proceder a eliminação”, ressaltou o especialista da Agência de Defesa Agropecuária do Paraná.

 

“A Portaria n.º 516/2022, de 01/02/2022, da Secretaria de Defesa Agropecuária, do Ministério da Agricultura, estabeleceu o período do vazio sanitário para a cultura da soja em nível nacional para o ano de 2022. A Adapar é a responsável pela fiscalização no território paranaense e tem a missão de responsabilizar e aplicar as penalidades previstas em legislação para os produtores que não fizerem a erradicação das plantas vivas de soja”, informou o estado do Paraná.