Vinhos de cultivar da Embrapa começam a chegar ao mercado
Segundo a instituição, a cultivar BRS Bibiana tem características como alta produtividade, adaptação e facilidade de manejo, se configurando como uma alternativa de inovação para as vinícolas
Os primeiros vinhos produzidos com a cultivar de uva BRS Bibiana, lançada em 2019 pela Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), começam a chegar ao mercado, de acordo com reporte da instituição. São três vinícolas familiares da região da Serra Gaúcha que estão comercializando as bebidas: Casa Zottis, Vinícola Cainelli e Vinícola Buffon.
“Desenvolvida pelo Programa de Melhoramento Genético “Uvas do Brasil” da Embrapa, a BRS Bibiana apresenta alta produtividade e requer menos tratamentos fitossanitários, gerando mais sustentabilidade ambiental e economia ao produtor. A uva ainda tem excelente potencial enológico e é adaptada às condições do clima subtropical úmido da Serra Gaúcha”, informa a entidade.
A cultivar BRS Bibiana, segundo dados da Embrapa, se trata de uma uva branca, com resistência às podridões de cacho, especialmente pela razão de que os cachos são soltos e não compactos. A instituição de pesquisa informa ainda que as bebidas (vinhos) produzidos a partir da fruta mostraram um perfil sensorial equivalente àqueles feitos com uvas europeias com nível de açúcar, na maturação, em torno de 21 graus Brix e acidez variando de 100 a 120 miliequivalentes (mEq) por litro.
“Ao degustar o vinho elaborado com a BRS Bibiana, o perfil sensorial remete sutilmente ao Sauvignon Blanc, uva muito utilizada em diversos países do mundo, mas pouco adaptada à Serra Gaúcha, em função das condições climáticas”, explica o pesquisador Mauro Zanus, da Embrapa Uva e Vinho.
Devido à adaptação, fácil manejo e produtividade, Zanus crê que a cultivar BRS Bibiana se mostra como uma grande oportunidade para que as vinícolas inovem na criação de suas bebidas, que podem ser vinhos brancos tranquilos como frisantes, além de ser uma opção para corte (blend) com outras variedades.
“Hoje o consumidor busca novas propostas, vinhos diferenciados; e nada melhor do que elaborar um vinho brasileiro com uma cultivar nacional, como a BRS Bibiana”, destaca o enólogo Roberto Cainelli Júnior, da Vinícola Cainelli. Localizada no município de Bento Gonçalves, no Rio Grande do Sul, a vinícola familiar existe desde 1929. Após algum tempo fora de atividade, as atividades foram retomadas em 2010, ocasião em que Cainelli Júnior assumiu como enólogo.
Segundo Júnior, em 2011, a vinícola já conquistou diversas premiações e desde então a equipe foca mais e mais em trazer inovação ao setor vitivinícola. “A melhor maneira de contar a nossa história é através de nossos vinhos. E encontramos nas variedades da Embrapa uma alternativa para valorizar o produto nacional e oferecer um produto diferente para o nosso cliente”, reforça. Mais do lançamento da BRS Bibiana, o enólogo conta que a BRS Lorena, outra cultivar da Embrapa, faz sucesso na vinícola desde o seu lançamento. Na última safra, Júnior fez o vinho da BRS Lorena passar por barrica de carvalho, uma inovação, e a conservação da bebida junto à madeira nobre adicionou uma maior complexidade e novos aromas e sabores. De acordo com o enólogo, o resultado foi um sucesso, com a produção totalmente vendida e já com um segundo lote atendendo a lista de encomendas.
Outro que apostou na fabricação, desta vez de um frisante, à base da BRS Bibiana foi o enólogo Anderson Buffon. A bebida veio como resultado de uma busca por novidades para os clientes. Buffon pontua que conheceu a uva durante uma degustação promovida pela Embrapa durante a Fenavinho, em junho de 2022, e foi uma inspiração já no primeiro gole.
“O vinho tem um sabor de frutas tropicais, como maracujá, manga e abacaxi. A partir do método tradicional, fiz vários testes e optei por elaborar com um frisante demi-sec. Ele ficou muito interessante”. Buffon acrescenta que os clientes que provaram a bebida também aprovaram. Desta maneira, a expectativa dele é de que as 400 garrafas elaboradas na vinícola familiar, que fica no distrito de Faria Lemos, de Bento Gonçalves, sejam logo vendidas, abrindo novas oportunidades de mercado para a cultivar. Buffon também tem no seu portfólio produtos elaborados com a BRS Lorena.
Na Serra Gaúcha, mais precisamente no coração do Vale dos Vinhedos, fica a Casa Zottis, propriedade do casal Juliano e Daniela Zottis. A vinícola também vai lançar o vinho tranquilo feito com a uva BRS Bibiana integrando da linha Cantare, uma homenagem ao “nono” Danilo. Segundo o reporte da Embrapa, o casal foi parceiro da instituição durante o processo de validação da cultivar BRS Bibiana e agora também apostam ao ser um dos primeiros a lançar o vinho da variedade. “A gente consegue colher a uva com uma sanidade muito boa e isso reflete na taça, com aromas finos e muita refrescância”, comenta Daniela, que também é a enóloga da cantina.
Daniela aposta que o vinho da BRS Bibiana seguirá o mesmo sucesso do vinho da BRS Lorena, que considera ser o ideal para os consumidores interessados em passar do suave para o seco. “As cultivares BRS nos diferenciam dos demais produtores, não apenas para a elaboração de vinho, mas pelas uvas sem semente que vendemos in natura, como a BRS Vitória, a BRS Clara e a BRS Isis, que são um sucesso com os turistas”, ressalta.
“Juliano Zottis, que fica responsável pela produção das uvas, reforça que as cultivares desenvolvidas pela Embrapa são excelentes para o viticultor pela qualidade e quantidade. Ele destaca que a sustentabilidade que essas cultivares possibilitam, com a redução da aplicação de agroquímicos, é um grande diferencial. Em alguns casos, nas uvas de mesa, é possível a produção orgânica”, aponta o reporte da Embrapa.
Thompson Didoné, chefe do escritório da Emater de Bento Gonçalves e um dos responsáveis pelo Programa de legalização de pequenas vinícolas familiares no estado do Rio Grande do Sul, avalia que as variedades de uvas desenvolvidas pela Embrapa representam oportunidade para que pequenos produtores agreguem valor às suas bebidas. “Acreditamos que as cultivares BRS são uma excelente alternativa para agregar valor ao vinho elaborado pela agricultura familiar. Já podemos ver isso nesses primeiros vinhos da BRS Bibiana que chegam ao mercado.”
Sobre a BRS Bibiana
“A inspiração para o nome veio da personagem Bibiana Terra Cambará, gaúcha forte e eternizada no romance “O Tempo e o Vento”, escrito por Érico Veríssimo, há mais de 70 anos (1949). Além de numerosas reedições, o livro foi eternizado em adaptações para o cinema e a televisão”, informou a Embrapa.
Uvas BRS sob os holofotes
A perspectiva da Embrapa Uva e Vinho é que a BRS Bibiana siga o caminho de sucesso da BRS Lorena, lançada no ano de 2001, e muito utilizada por produtores. Ainda de acordo com a instituição, a variedade Lorena é destaque nos portfólios dos viticultores que estão lançando os primeiros vinhos da BRS Bibiana. Já famosa por por ter seus vinhos selecionados em degustações às cegas, com outros moscatéis, A BRS Lorena se destaca pela tipicidade, intensidade, qualidade dos aromas e sabor.
“Temos observado cada vez mais consumidores buscando produtos elaborados com a BRS Lorena. Por outro lado, diversos vitivinicultores estão apostando na cultivar, desenvolvendo produtos de qualidade, com uma excelente apresentação, seja no modelo da garrafa, nos rótulos diferenciados ou tipos de embalagens, o que agrega valor ao produto”, comenta o chefe de Transferência de Tecnologia da Embrapa Uva e Vinho, Marcos Botton.
O vinho “Tempos de Goes”, produzido com a BRS Lorena pela Vinícola Goés, de São Roque, em São Paulo, é um dos exemplos que ainda tem uma versão em lata. A vinícola também apostou na cultivar para criar um Vinho Licoroso - Edição Especial Gumercindo de Góes 2011, internacionalmente premiado.
Botton destaca que, na Serra Gaúcha e em outras regiões produtoras, diversas vinícolas estão incluindo os produtos elaborados com a BRS Lorena em seus portfólios ou mesmo valorizando as outras cultivares desenvolvidas pela Embrapa, como é o caso da Adega Chesini, uma pequena empresa de Farroupilha.
Comandada por Ricardo Chesini, a Adega Chesini inovou e trouxe a coleção Le Ragazze – As Garotas de Identidade Brasileira, na qual, além da tradicional cultivar Isabel, desenvolveu produtos especiais com a BRS Lorena, BRS Cora, BRS Rúbea e BRS Carmem, todas resultantes do Programa de Melhoramento Genético “Uvas do Brasil” da Embrapa.
“Todo o projeto foi bastante pensado. Desde a escolha das cultivares, a descrição dos rótulos, os desenhos, a embalagem. Enfim, foi um trabalho bastante gratificante e que está sendo muito valorizado pelos consumidores”, avalia Chesini.
Homenagem às uvas nacionais feita pelos Correios
“Em 2020, a Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos lançou uma coleção com cinco selos comemorativos, homenageando cultivares de uvas brasileiras, desenvolvidas pelo Programa de Melhoramento Genético ”Uvas do Brasil”, coordenado pela Embrapa Uva e Vinho. As uvas BRS Vitória, BRS Magna, BRS Lorena, BRS Margot e Moscato Embrapa foram as selecionadas, dentre o portfólio de 21 cultivares já lançadas pelo Programa, para celebrar esse importante momento”, ressalta a Embrapa no reporte.