Blog conecta.ag  | Assinatura química arroz preto

Arroz preto produzido no Brasil tem assinatura química própria que pode agregar valor ao produto

Os estudos utilizaram os compostos fenólicos presentes nos grãos como biomarcadores para a distinção da origem do arroz preto


Uma parceria entre a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) e a Universidade Federal de Pelotas (
UFPel) no Rio Grande do Sul resultou em um estudo que evidencia traços químicos que distinguem o arroz preto produzido no Brasil. Essa constatação, segundo a Embrapa, aponta para a possibilidade de existirem assinaturas para esse produto a partir da cultivar adotada e da região produtora. 

Estes traços químicos particulares do arroz preto produzido nacionalmente abrem novas possibilidades de mercado para produtos exclusivos e regionais, além de influenciarem na qualidade dos grãos de arroz preto como alimento funcional, já que a presença de alguns compostos fenólicos, como flavonóides e antocianinas, chega a ser dez vezes superior à encontrada no arroz branco, consumido em larga escala. 

O estudo foi publicado na revista Food Chemistry e detalhou as análises laboratoriais realizadas com duas linhagens: a AE153045, da Embrapa; e a cultivar comercial IAC 600, produzidas sob sistema irrigado em áreas experimentais de pesquisa da empresa e seus parceiros, no Vale do Paraíba (SP) e em seis municípios do Rio Grande do Sul.

Foram utilizados os compostos fenólicos presentes nos grãos como biomarcadores para a distinção da origem do arroz preto durante o experimento, e a identificação de alguns destes compostos nas cultivares pesquisadas, associada à influência de seu local de produção, o que abre margem para a utilização comercial de produtos naturalmente diferenciados e regionalizados. 

"Dessa forma, é possível valorizar marcas vinculadas a determinados territórios, agregando valor ao produto, e estabelecendo um diferencial competitivo frente aos concorrentes. A exemplo do que já ocorre com o café e o vinho, é possível definir e promover regiões produtoras no Brasil", aponta o reporte da Embrapa.

Nathan Vanier, professor do Laboratório de Pós-Colheita, Industrialização e Qualidade de Grãos da UFPel e um dos coordenadores da pesquisa, enfatiza que os estudos com o arroz preto buscaram alternativas para estabelecer qualidades do produto, de forma criar mais oportunidades de mercado no país. Segundo ele, no Brasil, a comercialização nacional de arroz preto, ao contrário de países europeus e dos Estados Unidos, é ainda incipiente. O produto é muitas vezes importado e alcança preços bem maiores do que o arroz branco do tipo agulhinha. “Procuramos encontrar nos compostos fenólicos características de interesse dos consumidores”, complementa. 

Resultados diferentes em áreas diferentes

O estudo mostrou que o acúmulo de compostos fenólicos nos grãos, principalmente as antocianinas, foi até três vezes superior em Santa Vitória do Palmar (RS), em comparação aos outros locais, como Taubaté (SP), por exemplo. Como essas substâncias são responsáveis por conferir a coloração dos grãos, a cor preta é mais intensa na primeira região, segundo dados da Embrapa.

A diferença de mais de 10 graus de latitude entre as duas localidades pode ter sido um dos fatores que influenciou na biossíntese (processo de produção de compostos químicos complexos, vital ao metabolismo das plantas) e no teor de antocianinas, uma vez que a mudança de latitude atinge as lavouras de arroz de diferentes maneiras, pela duração do dia, radiação solar e qualidade da luz, induzindo o arroz a produzir mais ou menos compostos fenólicos. 

Além disso, conforme explica o reporte da Embrapa, a zona Sul, onde está Santa Vitória do Palmar (RS), é uma região orizícola também conhecida por abrigar empreendimento para produção de energia eólica. O vento pode ser um fator causador de estresse à planta, e os compostos fenólicos são produzidos pelo metabolismo especializado das plantas em resposta a estresses.

O pesquisador José Colombari Filho, coordenador do programa de melhoramento de arroz da Embrapa Arroz e Feijão, destaca a influência da interação entre genótipo e ambiente. 

“A síntese de compostos fenólicos é um fenômeno que depende da genética da cultivar e das suas interações com as condições ambientais do local de produção, por isso é que as respostas não são lineares. Os grãos produzidos em Santa Vitória do Palmar apresentaram maior teor de compostos fenólicos, provavelmente, em resposta a fatores como maior ocorrência de ventos, luminosidade e período de radiação solar. Isso fez com que a planta se protegesse mais, aumentando a quantidade dessas substâncias nos grãos”, pontua.