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Colapso interno em mangas é alvo de pesquisa que estuda a detecção do problema pelo aroma da fruta

Informações apontam que a cor, a firmeza e os compostos voláteis são imprescindíveis para oferecer algumas informações sobre as alterações fisiológicas causadas pelo distúrbio


Em relatório divulgado pela Embrapa neste mês de agosto, foi divulgado que há um estudo em andamento, sendo realizado por pesquisadores de cinco instituições públicas do país com o objetivo de detectar o chamado colapso interno, um grave problema que afeta os frutos de manga e causa prejuízos econômicos aos produtores e comerciantes. A equipe de cientistas pôde observar que aromas e compostos voláteis podem servir como marcadores, “alertas”, para apontar as diferenças entre os frutos saudáveis e aqueles que apresentam o problema.

 

O colapso interno, segundo informações divulgadas pela Embrapa, é conhecido como um distúrbio fisiológico na fruta,  que acaba provocando o amadurecimento prematuro, aspecto gelatinoso na polpa da fruta, escurecimento da cor, sabor mais adocicado e amolecimento por baixo da casca. A entidade destaca ainda que este problema do colapso interno é difícil de ser detectado externamente, sendo mais frequentemente observado no momento do consumo, quando os frutos são geralmente descartados, o que acaba ocasionando desperdício.

 

 

“Baseado inicialmente em uma pesquisa de mercado e, posteriormente, em modelos estatísticos, o estudo identificou diferença no aroma, além de detectar, qualificar e quantificar uma série de compostos voláteis na casca e no fruto, que se revelaram como indicativos de marcadores de colapso interno. Os dados mostraram que a cor, a firmeza e os compostos voláteis são importantes para fornecer algumas informações sobre as alterações fisiológicas causadas pelo distúrbio, que ainda não são totalmente conhecidas. Mas é de ocorrência tanto no mercado nacional como no internacional”, informou o relatório da Embrapa.

 

Sendo assim, o estudo dos pesquisadores da Embrapa Instrumentação (SP), além da Universidade de São Paulo (USP), Universidade Federal de São Carlos (UFSCar) e Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” (Unesp), com a colaboração da Companhia de Entrepostos e Armazéns Gerais de São Paulo (Ceagesp), se torna imprescindível para ajudar a compreender melhor o problema. Os resultados obtidos durante a pesquisa podem dar suporte à  elaboração de estratégias que auxiliem na identificação do distúrbio fisiológico futuramente, antes do consumo, e manejo para reduzir as perdas dos frutos causadas pelo colapso.

 

O estudo foi liderado pela engenheira-agrônoma Fernanda Campos Alencar Oldoni, para a obtenção do título de doutora em Alimentos e Nutrição pela Unesp, campus Araraquara. De acordo com ela, o problema do colapso interno é abordado pela comunidade científica desde a década passada.

 

Sob a orientação de Marcos David Ferreira e coorientação de Luiz Alberto Colnago, pesquisadores da Embrapa, Oldoni realizou de maneira preliminar uma pesquisa de mercado com o objetivo de investigar e explorar o distúrbio fisiológico por meio da percepção de atacadistas da Ceagesp.

 

“Essa etapa identificou, pelo aroma, que as variedades de manga Palmer e Tommy Atkins são as mais suscetíveis ao distúrbio fisiológico. Já em experimentos realizados em laboratórios, com métodos avançados de análise, os pesquisadores encontraram mais de 100 compostos voláteis diferentes nos frutos, dos quais oito estão relacionados ao colapso interno”, pontua a Embrapa.

 

O colapso interno provoca amadurecimento prematuro, aspecto gelatinoso na polpa da fruta, escurecimento da cor, sabor mais adocicado e amolecimento por baixo da casca - Foto: CNA

 

Aromas que trazem respostas

A pesquisa de prospecção realizada pela cientista foi aplicada com 30 atacadistas da Ceagesp por meio de questionários, nos quais as respostas ajudaram compreender melhor as causas e delinear um perfil para caracterização do colapso interno e planejamento do estudo.

 

“O questionário levantou informações sobre as percepções dos atacadistas quanto à maturação e refrigeração dos frutos, as reclamações sobre o colapso interno e percentual do distúrbio nas cargas comercializadas, variedades mais sujeitas ao distúrbio, além de possíveis sinais externos indicativos do colapso e fatores causais associados. As variedades Palmer e Tommy Atkins foram citadas por 93% e 76% dos entrevistados, respectivamente, como mais incidentes. De acordo com a pesquisadora, os atacadistas tiveram a percepção de que o tamanho do fruto e teor de fibras poderiam estar associados ao distúrbio, além de fatores externos, como a adubação”, informou a instituição.

 

Ainda sobre as respostas obtidas, 80% dos entrevistados apontou o  tamanho maior do fruto como sendo um dos responsáveis pelo aparecimento do colapso, ao passo que 76,7% destacaram que o teor de fibras é outro fator limitante.

 

Publicação em revista científica

Parte dos dados deste trabalho estão no artigo Fruit quality parameters and volatile compounds from 'Palmer' mangoes with internal breakdown, publicado na revista Food Chemistry, conforme divulgação da Embrapa.

 

Além de Fernanda Oldoni, pelo Departamento de Alimentos e Nutrição da Unesp, Marcos David Ferreira, Luiz Alberto Colnago e Camila Florencio, da Embrapa Instrumentação, assinam o artigo o professor Stanislau Bogusz Junior e as alunas Giovana Brait Bertazzo e Pamela Aparecida Grizotto, do Instituto de Química de São Carlos da Universidade de São Paulo (USP), e o professor Renato Lajarim Carneiro, do Departamento de Química da Universidade Federal de São Carlos (USFCar). O estudo recebeu apoio da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp) e da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoas de Nível Superior (Capes).

 

Na opinião dos agentes do atacado consultados durante a pesquisa, variedades com menos fibras, como a Tommy Atkins, apresentam o colapso interno com maior frequência. Mas 90% dos entrevistados acreditam que frutos maduros estão mais ligados com o aparecimento do colapso, seguido de adubação (76,7%), tipo de solo (50%), região de produção/origem (46,7%), plantas mais velhas (30%), armazenamento refrigerado (26,7%), clima quente (23,3%), seguido de época de colheita e clima frio, ambos representando 20% das respostas.

 

De acordo com a engenheira agrônoma Fernanda Oldoni, a percepção dos atacadistas que participaram do questionário diante de alguns destes fatores corroboram com estudos da literatura pesquisada, “tendo em vista que o baixo teor de cálcio, atraso na colheita e exposição de luz solar na pré-colheita podem estar associados ao aparecimento do colapso. Alguns estudos relacionam o distúrbio com o desequilíbrio nutricional das plantas no campo”, segundo dados da Embrapa.

 

Ela ainda relata que 93% dos entrevistados disseram terem sido avisados sobre reclamações por colapso nas cargas comercializadas. “As cargas não refrigeradas são comercializadas por 87% e refrigeradas por 70%, de acordo com os respondentes, sendo que 31% e 54%, respectivamente, relataram já terem apresentado perdas em cargas, por colapso, superiores a 5%. Outro fato apontado por 27% dos entrevistados é a de que frutos colapsados apresentavam um odor diferenciado. A diferença de aroma entre frutos com o distúrbio fisiológico e frutos sadios foi constatado in loco na Ceagesp” aponta o relatório.

 

O orientador Marcos David Ferreira destaca que a literatura científica sobre as capacidades distintas de humanos diferenciarem odores, inclusive, com implicações médicas, são amplas. De acordo com cientistas internacionais, isso se dá devido ao fato de que os corpos de seres humanos emitirem centenas de compostos orgânicos voláteis que podem afetar os odores pessoais.

 

Experimentos para detalhar dados

Tendo como base o levantamento realizado na Ceagesp, a pesquisa seguiu com experimentos em mangas Palmer em laboratórios, utilizando técnicas avançadas para identificar os compostos voláteis. Segundo a divulgação da Embrapa, os pesquisadores se basearam na hipótese de que os frutos com ou sem colapso interno apresentavam características físicas e composição química diferentes. Delineando os parâmetros físico-químicos em triplicata para cada amostra, os cientistas envolvidos no projeto caracterizaram e mensuraram os diversos compostos voláteis com a técnica de cromatografia gasosa acoplada a espectrometria de massa.

 

“Nós identificamos mais de uma centena de compostos voláteis diferentes nos frutos. Os voláteis de diversos frutos de manga foram extraídos, concentrados, separados e identificados, gerando uma quantidade enorme de informação”, conta o professor do Instituto de Química de São Carlos (IQSC-USP) Stanislau Bogusz Junior.

 

Com os resultados em mãos, após esta etapa, os pesquisadores desenvolveram uma tabela de dados com os compostos presentes em cada fruto e qual a concentração relativa de cada um em cada manga. A partir disso, foi utilizada técnica multivariada de análise de dados, a quimiometria, para mostrar quais os compostos voláteis eram capazes de diferenciar um fruto com o distúrbio fisiológico entre os saudáveis.

 

O processo da quimiometria é a utilização de modelos matemáticos, entre outros, para converter dados numéricos em informações de caráter químico. O professor Renato Lajarim Carneiro, da UFSCar, explica que foram utilizadas as técnicas quimiométricas de análises de componentes principais (PCA) e a de regressão por quadrados mínimo parciais para análise descriminante (PLS-DA).

 

“A PCA possibilita analisarmos o quão similar são os perfis químicos dos voláteis quando comparamos diversos frutos, ou seja, possibilita enxergar se existe alguma diferença evidente entre os tipos de compostos voláteis ou mesmo diferença na concentração de um mesmo composto, quando comparamos uma manga colapsada e um fruto não colapsado. Já o PLS-DA permite que criemos um modelo matemático correlacionando a presença dos compostos e a concentração relativa deles com o colapso interno do fruto”, esclareceu o professor.

 

Segundo Carneiro, isso torna possível observar quais os compostos voláteis responsáveis por apontar as diferenças entre frutos com ou sem colapso, o que torna possível a identificação de um fruto colapsado apenas analisando os compostos exalados pelo fruto. O ácido metacrílico, éster etílico, etanoato de isopentenila, óxido de limoneno, (E)-2-pentenal, tetradecano e γ-elemeno estão entre os principais marcadores voláteis do colapso interno encontrados nos frutos.

 

Oldoni concluiu que a avaliação quimiométrica foi adequada para identificar os parâmetros físico-químicos e os compostos voláteis relacionados ao distúrbio fisiológico. “Os frutos com colapso interno apresentaram aumento do índice de cor na casca e na polpa, amolecimento da polpa e realce do sabor”, relata a pesquisadora.