Fruta típica do Rio Grande do Sul, o Butiá, ganha novas formas de beneficiamento nas mãos de produtores gaúchos
Projeto de transformar a fruta em outros produtos para serem comercializados foi idealizado pela Secretaria de Agricultura do estado
A pesquisa “Diagnóstico de extração, processamento e comercialização de produtos oriundos de butiazais no RS”, desenvolvida por pesquisadores do Departamento de Diagnóstico e Pesquisa Agropecuária da Secretaria da Agricultura, Pecuária e Desenvolvimento Rural (DDPA/Seapdr), conseguiu integrar agricultora, chefe de cozinha e designer de moda. O estudo, coordenado pela médica veterinária, mestre em Desenvolvimento Rural e doutora em Gestão, Larissa Ambrosini, realizou entrevistas qualitativas para descrever iniciativas bem-sucedidas e os usos menos comuns cuja matéria-prima fosse oriunda de butiazeiros.
Um dos exemplos, a Família Bellé Agroecologia & Agroindústria, tinha como desejo a busca por uma vida mais saudável, de acordo com o integrante da família Nélio, que notou há décadas que pessoas da região onde mora estavam tendo problemas de saúde ou até falecendo devido ao uso de agroquímicos.
Hoje, na localidade Linha Silva Tavares, município de Antônio Prado, Nélio gerencia a propriedade de 3,75 hectares com a filha Franciele, a esposa Aldaci e o genro Rodrigo em um sistema agroecológico, agroflorestal e orgânico. Também utilizam 6 hectares do irmão para plantar. O destaque é na produção orgânica e na oferta de Plantas Alimentícias Não-Convencionais (Pancs) e de frutas nativas como butiá, guabiroba, araçá, entre outras.
Após colhidas, as frutas passam por processamento na agroindústria, que foi a primeira no Rio Grande do Sul a obter o registro do suco de butiá (como bebida) no Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa), em 2011.
Segundo Franciele, a família iniciou a produção com a polpa congelada, entretanto, era necessário ter uma grande estrutura de congelamento que a família não dispunha na época. Então, de acordo com ela, passaram a engarrafar o produto. “E aí surgiu a bebida. Mais tarde começou a se engarrafar também a polpa nos potes de vidro”, esclarece.
“A partir daí evoluímos bastante, tanto no consumo, quanto na produção. Hoje processamos e vendemos a polpa de butiá para todo o Brasil, com foco em São Paulo, Rio de Janeiro, Santa Catarina, Paraná e Brasília (DF), além do Rio Grande do Sul. E temos convite para exportar para a França, Canadá e Inglaterra. Porém ainda é pouco. O consumo é relativamente baixo e um reconhecimento por parte dos produtores mais baixo ainda”, lamenta Franciele.
Outro exemplo de uma iniciativa com o uso do butiá é a do chefe de cozinha Carlos Kristensen, responsável pela "Internacionalmente Local", e que conduz o UM Bar&Cozinha, e o Hashi Restaurante em Porto Alegre. Ele produz em seus restaurantes e através da sua marca um trabalho de priorização e valorização das matérias-primas locais, oriundas de propriedades familiares e com manejo sustentável, e o butiá é utilizado de forma original em pratos salgados, sobremesas e drinks nos estabelecimentos.
“Nossa cozinha começa no campo, no produtor. A pesquisa do DDPA reforçou o que a gente já sabia. E é importante conhecer e estar inserido nessa cadeia produtiva. Antigamente a gente ficava na cozinha esperando o ingrediente chegar”, conta Kristensen. “A partir de 2011, fiquei inquieto com isso e passei a ir ao interior pra conhecer de onde vinham os produtos, quem produzia”, disse Kristensen.
Foi desta forma que nasceu o Internacionalmente Local, um projeto que visa trabalhar junto com o produtor artesanal, gerar demanda por parte dos restaurantes, e mostrar formas criativas e de uso pelo cliente. “A ideia é aproximar essa cadeia produtiva do consumidor final, fazendo com que esse ciclo faça sentido pra todos: quem produz, quem prepara e quem come. O Internacionalmente Local nasceu então dessa inquietude de buscar o alimento na fonte, de poder conhecer as pessoas, os produtores”, diz o chefe de cozinha.
Sobre o uso do butiá, Kristensen avalia que ainda é restrito. “A gente começou a usar a fruta em 2011, 2012. Começamos a trazer o butiá para dentro das cozinhas e testar o comportamento dele. Fizemos uma pesquisa de como ele se comportava no doce e no salgado, e acabamos elencando alguns produtos que fazem sentido pra gente e hoje são sucesso: um é a mostarda de butiá, o nosso principal produto feito com a polpa”.
Outro empreendimento interessante é a marca Apoena Bolsas, que produz bolsas e luminárias usando a palha e os talos das folhas do butiazeiro como principal matéria-prima. A designer de moda, empresária e responsável pela marca, Maiara Fonfanti, explica que a empresa é familiar e se localiza em Giruá. É neste município que é feita a coleta de folhas em áreas próprias, praticando o manejo sustentável das palmeiras e fazendo o plantio de novos exemplares. A empresa fornece produtos para lojas-conceito da Renner e já teve suas criações recomendadas pela revista Vogue Brasil como opções de moda sustentável e com alto padrão de design.
“Trabalhamos diretamente com a folha da nossa palmeira. Giruá é a terra do butiá. A gente tem muito orgulho de dizer isso. É onde acontecem as festas do butiá, que reúnem artesanato, comida, licor, tudo em volta do butiá, que é a nossa árvore-símbolo da cidade”, diz Maiara.